Colheita 2016

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terça-feira, 24 de maio de 2011

O que é abundância?


Em minha família era costume dizer de forma jocosa (e talvez até pouco 'educada' para um blog) que aquilo que abunda não falta (ou não prejudica).
Ou seja, quando algo é abundante, é porque está disponível largamente e facilmente.
No entanto, lendo aquele livro 'Mil Dias na Toscana', a autora Marlena de Blasi fala sobre o conceito de abundância ligado ao fato de 'ter de mais' e também ao fato de 'ter qualidade' em relação à quantidade.
Por isso meu questionamento: o que é abundância para você?



Como tantas outras pessoas eu já passei (e passo ainda) por fases onde há mais dinheiro e menos dinheiro, mais amor e menos amor, maior facilidade em fazer as coisas e menor, saúde em ordem e em desordem, ou seja, tenho fases onde as coisas boas abundam e fases onde as ruins também.
Embora para mim, o conceito de abundância esteja ligado a uma visão mais positiva do que negativa das coisas.
Gosto de ver minha adega cheia, mas não tenho nenhum problema em esvaziá-la para uma festa ou para meus amigos. Gosto de ter em minha mesa um excelente azeite, mas se não posso comprá-lo neste mês, talvez possa no próximo e isso não me fará menos feliz hoje.
É óbvio (ainda ontem estava pensando nisso enquanto dirigia para minha casa), que eu gostaria de ter um tempo em que meus recursos financeiros não fossem totalmente direcionados para pagar as contas e sustentar a própria vida. Eu gostaria - não de ser milionária -, mas de saber que o meu trabalho me proporciona rendimentos suficientes para mais do que o absolutamente necessário. Isso seria muito bom e talvez me mostrasse um novo lado da abundância.
Mas, o interessante é que me considero rica. Rica em pessoas que me querem bem (embora nem sempre, como tudo o mais na vida...rs), rica em saúde, rica em bons sentimentos, em boas experiências (e nas más que nos ensinam esse conceito), enfim, rica naquilo que é importante para mim.


A autora do livro falava de experiências e sentimentos utilizando a metáfora da comida. Dizendo que os americanos da Califórnia (onde ela vivia e trabalhava como crítica de gastronomia) exageram nas produções e nas invencionices que deixavam a comida igual a maior indústria do estado: "comida cenográfica", linda de ver, mas sem alma per se.
Quando foi viver na Toscana, ela se deu conta que a comida é uma coisa muito, mas muito séria, porém encarada com simplicidade, onde a abundância significa ter coisas boas, na época certa, a preços justos. E não ter "tudo ao mesmo tempo agora" como parece ser a moda na velocidade da web e que gera tanta ansiedade e tanto conflito em nossa sociedade.
Vejam o prato acima, por exemplo, de antepastos de um restaurante do norte da Itália, na cidade de Conegliano. São produtos locais, que estavam na safra ou foram preparados e preservados seguindo as tradições de um povo onde a industrialização foi tardia, e o frio e as guerras não permitiam desperdícios.
Pão caseiro, presunto de dois estilos, alcachofras em conserva, salada de feijões brancos, verduras amarguinhas que suportam o inverno e queijos.
Tudo em abundância, certo?
O que mais seria necessário, além da fome? Uma taça do bom espumante local, em preço justo, em qualidade sempre compatível com o que é servido. 
Vale lembrar que esse não é um restaurante qualquer, é o melhor da cidade, elegante, 'classudo', bem frequentado. Mas sem frescuras, sem embelezar o que é bom naturalmente.
Como conseguir isso por aqui?
Em SP é quase impossível. Comer fora em SP é muito bom, mas não raro é um abuso de preço e de arrogância.
Abundância por aqui é comparada muitas vezes com 'uma montanha de comida' como frango frito, polenta e batatas, rodízio de sushi, churrascarias com buffets de salada que mais parecem a Ceasa (com a seção de peixes inclusa). Parece-me que abudância e fartura são sinônimos por aqui.
Mas não são. Até porque a fartura não garante a qualidade.
Quando se fala em vinhos então, a coisa fica ainda mais grave. Um bom vinho, a preço justo parece ser uma coisa impossível de se conseguir e quem consegue passa por bobo às vezes, pois para muita gente beber bem ainda é beber caro e beber raro.
Bem, eu gosto de vinho, gosto de vinho sempre e não tenho fundos para beber 'caro e raro' todos os dias.
Ainda por cima acredito que vinhos devem combinar com o momento, com a disposição, com a comida e com a companhia. Por isso, nem todo parente é boa companhia para um Grand Chateau de Bordeaux, nem todo arroz branco vai com o melhor espumante.
Felizmente, existem exceções. No final de semana passado tive a grata surpresa de ir visitar a pequena importadora 'La Cave Jado', de propriedade de 3 franceses que estão agradavelmente se 'aculturando' no Brasil.
Seus vinhos são de pequenos produtores e custam preços justos, entre 44 e 170 reais (o mais barato é um Muscadelle e o mais caro é um Champagne super saboroso). Para todos os gostos e estilos, eles são no geral fáceis de beber e servem para a gente parar de pensar que todo vinho francês é caro e que os mais em conta são ruins.

A loja (na foto acima), é despretencisosa e agradável de estar. Não tem frescura nenhuma. É como um bom baguete, um cacho de uvas frescas doces, um copo de água mineral geladinho e fatias de um bom embutido. Tudo combina, com delicadeza e abundância.
Para completar, nesse final de semana ainda tive a agradável possibilidade de degustar um tinto brasileiro de uma região nova - Campos de Cima da Serra - perto de Vacaria, um Cabernet Sauvignon 2008 que custa apenas 25 reais e vale bem mais do que isso. A vinícola é a Aracuri e o enólogo é o jovem Cristiano Zorzan. 

Por fim, acredito que muitas vezes confundimos abundância com sofisticação, qualidade com aparência, oferta com propaganda.
Separar tudo isso é complicado e envolve pararmos para pensar um pouco sobre o que é importante, o que é necessário no momento e como devemos fazer nossas escolhas.
Bons goles e boa semana para todos!

Ah! os sites: www.cavejado.com.br e www.aracuri.com.br


Um comentário:

  1. Olá Sílvia,
    ontem fiz mais uma incursão a serra, fui primeiro a Nova Pádua na Vinícola Boscato, queria saber o motivo do vinho deles estar um tanto adocicado, me explicaram q se trata de uma nova forma de fermentação, tanque na horizontal e ainda retiram as sementes, o que segundo eles amaciou o vinho. enfim, comprei uma caixa de merlot pro meu restaurante e tem sido bem aceito.. almoçei no casa nostra em Flores da Cunha, muito boa a comida e preços justos nos vinhos.. depois do almoço fiz Anghebem e Pizzato, tive a sorte de encontrar o sr. Francisco Anghebem e recebí uma verdadeira aula de vitivinicultura e história do vinho na região..na Pizzato degustei o Concentus que segundo a Carolina(atendente) esta quase igual ao DNA 99.. realmente é um baita vinho..
    a respeito do teu post, quando montamos o restaurante aqui optamos pelo sistema de parrillada justamente para contrapor a fartura/festival/desperdício da carne que acontece em muitas churrascarias...
    se vieres para o sul dá um toque..
    saludos
    Jose@penadelsur.com.br

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