Colheita 2016

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segunda-feira, 11 de abril de 2011

O selo fiscal está no mercado

Meu amigo Marcos (jornalista e enófilo) permitiu que eu reproduzisse aqui o texto que ele colocou em seu site hoje.
Acredito que seja de leitura obrigatória para todos os apreciadores de vinho. Não se trata de demonizar ninguém e nem nenhuma instituição, mas sim alertar para os 'band aids' que são colocados sobre grandes feridas: encobrem, por vezes até protegem, mas não curam.
Marcos é um dos meus poucos amigos do mundo do vinho, principalmente pelo fato de termos visões muito parecidas dessa indústria, embora tenhamos paladares diferentes para a degustação. Assim, fico feliz em publicar o texto dele aqui, até porque eu mesma gostaria de tê-lo escrito.



O selo fiscal está aí
Os defensores dessa maravilha da bur(r)ocracia nacional venceram a batalha. Era só disso que o vinho brasileiro precisava para ser mais competitivo?
Marcos Pivetta/www.jornaldovinho.com.br

11/04/2011


Enfim, ele chegou. Passei no supermercado no fim de semana e já vi algumas garrafas de um rótulo chileno com o polêmico selo fiscal do vinho. A foto está abaixo e não me deixa mentir. Havia garrafas do mesmo vinho, da mesma safra inclusive, com e sem o selo. Estamos numa fase de transição, em que, como disse, há vinhos com e sem selo fiscal. Até que, um belo dia, provavelmente no ano que vem, todos os fermentados de uva vendidos no Brasil, importados ou nacionais, exibirão o tal papelzinho junto ao gargalo da garrafa. Nesse dia, a produção de vinhos no Brasil terá sido então sido salva por esse maravilhoso instrumento da bu(r)rocracia. O selo fiscal.

Como se sabe, produtos com selos fiscais são, por definição divina, à prova de fraude. Mais rápidos e inteligentes que seus colegas do vinho, os produtores de uísque e de outras bebidas mais fortes já usam esse artifício anti-contrabando e anti-pirataria há tempos e, claro, seus produtos nunca entraram no Brasil ilegalmente ou foram alvo de falsários. Ninguém nunca comprou um uísque, selado, que fosse também falsificado ou contrabandeado. Sendo essa uma verdade inquestionável, o futuro do vinho brasileiro, com o selo, estará garantido.
Vida longa ao selo fiscal, o salvador do vinho nacional! Uau, até rimou.

E o consumidor brasileiro, como fica? Fica como sempre ficou: pagando preços absurdos por vinhos, nacionais ou importados, nas prateleiras de lojas e supermercados. E agora, quando o preço do nosso Cabernet ou Merlot do dia a dia subir, os comerciantes terão mais uma desculpa na ponta da língua para explicar o reajuste: culpa do selo.
Outro dia falei com o Adolar Hermann, dono da importadora Decanter, que estimou um aumento de 3% a 5% no preço final dos vinhos em razão da adoção dessa maravilha da burocracia. O aumento não seria sentido agora, mas ao longo dos próximos meses, acredita Hermann. Pode ser que o aumento não chegue a isso. Os defensores do selo, basicamente os dirigentes que representam os produtores de vinho brasileiro, sobretudo as grandes empresas, dizem que o custo do selo é irrisório. Pode até ser. Mas essa não é, a meu ver, a questão central.

O problema é que, ao levantar a bandeira do selo fiscal, os dirigentes do vinho brasileiro parecem querer dizer o seguinte: só não conseguimos competir com o produto importado porque a maior parte dos rótulos do exterior entra ilegalmente no país. Agora, com o selo, podemos bater de frente, em termos de preço e qualidade, com qualquer um. Não é verdade. Claro que o contrabando provoca estragos, mas eles são setorizados. Não acredito que a entrada ilegal de vinhos no país seja a responsável pela falta de competividade do vinho nacional. Será que há tanto vinho assim contrabandeado nas grandes redes de supermercado, onde é vendida boa parte dos rótulos comercializados no Brasil?

Na minha opinião, o vinho brasileiro ainda tem três problemas: na visão do consumidor médio: imagem ruim, qualidade inconstante e preço alto. Nesse universo, os espumantes nacionais são uma exceção, com bons rótulos a preços justos, embora até nesse segmento os preços tenham subido nos últimos anos.

OK, com força em Brasília, os defensores do selo ganharam essa batalha. Mas pergunto: e agora? O setor só precisava do selo para ser eficiente? Não precisa reformar mais nada? Ninguém vai explicar ao consumidor porque é mais barato e mais viável produzir vinho no Chile ou na Argentina do que no sul do Brasil? Ninguém vai dizer que nesses países, diferentemente da Serra Gaúcha, quase não chove nos meses da colheita e que as nossas águas de janeiro, fevereiro e março são muito prejudiciais às safras verde-e-amarelas? Agora, então podemos cobrar preço e qualidade do vinho brasileiro, pois o inimigo do contrabando e da pirataria foi abatido?

Na minha opinião, o vinho brasileiro nunca vai ser, em termos de preço e qualidade, tão competitivo quando o de nossos vizinhos. Espero sinceramente estar errado (torço para que a Campanha Gaúcha me desminta), mas isso me parece ser um dado da realidade nacional. Uma questão de clima e geografia. Mas fazer vinho é um traço da cultura e do modo de vida dos italianos que se instalaram em partes do Rio Grande do Sul. Um traço bonito, que me alegra e comove sempre que vou ao Sul. Estou disposto a pagar um pouco mais para preservar a produção de vinhos no Brasil. Eu disse um pouco mais, mas não exageradamente mais — e desde que esse vinho brasileiro tenha um padrão mínimo de qualidade. Ele não será o dominante no mercado, mas continuará vivo. Resta saber se tem mais gente com amesma disposição.

Por que não discutir isso depois de toda a batalha do selo?

 Marcos Pivetta, degustando tintos na Itália.

Um comentário:

  1. Participem do Debate do Vinho na Fecomércio. Bacio,Didú.

    http://www.fecomercio.com.br/?option=com_eventos&view=interna&Itemid=11&id=3725

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