Colheita 2016

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segunda-feira, 18 de outubro de 2010

"Se é estrangeiro é bom!"

 Que o vinho brasileiro carece de identidade, isso já sabemos há muito.
Já foi pior, verdade seja dita, quando nossos vinhos - a grande maioria deles - eram mesmo ruins.
Hoje, que a nossa indústria está em pé de competição com qualquer outro país, era de se esperar que a situação da 'auto-estima' do vinho brasileiro tivesse mudado.
Infelizmente não mudou.
São vários fatores que contribuem para isso, alguns ligados à própria indústria e outros aos consumidores.
Para nossa extrema tristeza nossas décadas sem democracia (que por vezes coincidiram com os períodos de crise econômica) nos deixaram um alvo fácil para tudo o que vem de fora. Consumir vinho importado nos dá um 'status' que nos foi cerceado por anos.
Não importa que sejam vinhos de qualidade inferior, ou com um preço 5 vezes maior do que no país de origem. "É importado, vem de um país com tradição, portanto é bom", pensam nossos consumidores.
Eles precisam ser educados tal qual fazemos com bebês, que acabaram de deixar a amamentação, um pouquinho de cada vez, introduzindo novidades a cada semana que passa, até que se acostumem com os novos sabores.
Acontece que são adultos. São teimosos e vaidosos. São alvo fácil da propaganda pesada, dos preços baixos favorecidos por quaisquer acordos comerciais, pela ideia (errônea) de muitos produtores nacionais de que seus vinhos devem ser caros e raros, pois senão serão considerados ruins logo de cara, pela falsa sensação de segurança de um 'selo' de controle ou de qualquer medida restritiva ao que é estrangeiro, ainda que disfarçada de protecionismo.
Perdoem-me a expressão, mas o buraco é mais embaixo.
Instituições como o Ibravin, por exemplo, fazem campanhas pesadas para mudar essa imagem pobre que o brasileiro tem de seus vinhos, mas seu alcance ainda é pequeno, ainda assim torço para que continuem atuando. E para contrabalançar utilizam um artifício dúbio, que é de divulgar maciçamente os resultados obtidos com quaisquer estrangeiros que se disponham a provar nossos vinhos.
"Se o estrangeiro disse que é bom, então deve ser mesmo", é a imagem que passam para os consumidores. Novamente nossa validação não é interna, é externa.
Que Santo de Casa não faz milagre, isso todo mundo sabe, que a imprensa pode ser comprada com muita discrição, isso pouca gente nota, vide a quantidade de bobagem eleitoreira que recebemos em nossos emails todos os dias e que se diz 'vinda de fonte independente' ou 'da única pessoa que não tem medo de dizer a verdade'. E muita gente inteligente acredita nisso.
É tanta bobagem de todos os lados, tanta propaganda enganosa, tanta pataquada marqueteira que dá vontade de só beber água e nunca mais votar em ninguém.
Outra coisa, viver na nação dos 'Gérsons' é muito chato às vezes.
Cheio de gente que faz, vende, consome e divulga  mas que só quer levar vantagem em tudo. E não pelo motivo óbvio de que se faz um produto para ser vendido por que se acredita nele e para que ele gere renda para que você alimente e cuide de sua família e continue produzindo.
Não, as pessoas querem 'fortune and fame', necessitam de aprovação de seus pares para validar suas escolhas. Na verdade o que fica parecendo é que não interessa que seu produto seja bom e bem feito e que você acredite nele se o Robert Parker, a Jancis Robinson, a Decanter, o Descorchados e outros mais não disserem a mesma coisa (obviamente não desmerecendo o trabalho de nenhum desses profissionais/publicações, que tem obrigação de conhecer o que acontece no mundo do vinho seja lá onde for).
O consumidor brasileiro está errado sim, ao ter preconceitos bestas, ao se fixar a uma imagem antiga e antiquada de que nossos vinhos não prestam e só o que vem de fora é bom. Esse é um consumidor ignorante e de mente tacanha, que se importa mais com o que 'parece' do que com o que 'é'.
Ele deve receber um tratamento especial, caso de estudo do pessoal do marketing (e da psicologia também, penso eu), para saber como agir com essa resistência ou então abandoná-lo de vez e focar em outro tipo de consumidor mais aberto.
Mas nossos produtores e marqueteiros também têm sua parcela de culpa, ao viverem sempre no muro em relação aos importados. Querem ser iguais mas não querem que façamos comparações, querem que os estrageiros provem, aprovem, divulguem e comprem, mas não querem que o consumidor interno tenha a mesma capacidade/disponibilidade de discernir e de escolher. Querem que os preços dos outros baixem, mas querem que os seus continuem altos e inacessíveis, querem publicidade gratuita 'por que são os primos pobres' mas dizem que não acreditam em anúncios.
Como é possível comercializar assim?
Vinhos não fidelizam, vinhos são tão bons quanto o próximo rótulo, a próxima safra e é bobagem pensar que seja possível 'cultivar' um consumidor que só beba uma marca, de um só país. Isso não existe.
Como é possível acreditar em qualquer instituição/empresa se ela não acredita em si mesma e necessita de aprovação dos 'primos ricos', desde que eles não queiram vender vinho aqui?
Há pouco tempo um enólogo que eu tenho em alta conta me disse - e tenho testemunhas - que não entende por que o Brasil insiste em fazer vinhos, se não sabe comercializá-los. E completou dizendo que muitos produtores parecem não querer vender seus vinhos, só para poderem reclamar e se colocar como coitadinhos. Esse enólogo trabalha para uma enorme vinícola, mas para uma das que sabem vender, diga-se.
Então fica meu aviso para todos: consumidores - não sejam tacanhos e não acreditem em tudo só por causa de uma imagem estrangeira, produtores - não se rendam facilmente agora que aprenderam o caminho mais difícil que era o de fazer bons produtos e marqueteiros - não nos tratem a todos como ignorantes, vaidosos e tolos pois existem ações de marketing para cada público.
Bons e honestos goles!


Sobre a necessidade de aprovação, para aqueles que conseguem pensar 'fora da caixa':
http://www.humaniversidade.com.br/boletins/necessidade_reconhecimento.htm

3 comentários:

  1. Silvia querida, saúde. Obrigado pelo envio de seu post. Muito bom. Tem muito mais ainda a se dizer, mas está tudo engatinhando ainda. Parabéns! Vou indicar a leitura. Bacio. Didú.

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  2. Silvia, bom dia !
    Lindo, maravilhoso,,,,,,,muito bom o post, hehehehe,,,,,show de bola.
    É isso ai, vamos tentar mudar isso tudo.
    Vou repassar!!!
    Parabéns !!!

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  3. Sílvia, este teu último post é simplesmente perfeito. Concordo com tua avaliação em gênero, n° e grau. Temos no Brasil de fato uma casta de consumidores em cuja boçalidade encontro a única explicação para renegarem aspectos óbvios do próprio país em que vivem e, por outro lado, temos produtores de vinho com o que chamo de 'síndrome do arraial'. Explico mais em um email para ti.
    Saudações enológicas!

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