Depois de muitos dias considerando se eu deveria colocar ou não esta postagem aqui, hoje resolvi que sim.
Mesmo sabendo que este é um blog de vinho e que eu já ocupei muito deste espaço para falar de coisas pessoais, eu decidi que não podemos esquecer do dia de hoje, mesmo com a churrascada, mesmo com o futebol, mesmo com as crianças brincando e a lusitana roda girando.
Imagino que, tal qual a morte do Ayrton Senna, todo mundo com mais de 25 anos é capaz de lembrar do que estava fazendo na terça-feira, 11 de setembro de 2001. Eu também sou.
Eu trabalhava na revista VEJA naquele tempo, precisamente na edição de imagens internacionais. No horário dos ataques ainda não estava lá, mas meu marido (que trabalhava na revista National Geographic) me ligou pedindo para eu ligar a TV, ainda em tempo de assistir ao vivo e em cores ao avião que atingiu a segunda torre do World Trade Center.
Trabalhando há dez anos com imagens internacionais, eu havia visto muitas guerras (a primeira guerra de Bush pai ao Iraque, por exemplo, ou o terrível conflito na Bósnia), várias catástrofes naturais, uma série de guerras civis, fome, assassinatos, atentados e outras tragédias que assolam a humanidade. Eu costumava achar que tinha desenvolvido, ao longo das intermináveis noites, um certo distanciamento de tudo, para garantir que minhas reportagens fossem o mais isentas possíveis.
O 11 de setembro jogou tudo isso por terra, literalmente.
Não vou mencionar as horas de trabalho, pois isso faz parte de cada profissão que aceitamos exercer, mas sim da comoção, da tristeza, do horror que passei separando em caixas com nomes detestáveis como 'suicídios', 'resgates', 'partes de corpos', 'destroços', 'sobreviventes' etc, as milhares de fotos que recebemos na redação.
Há 10 anos nem todos os arquivos eram digitais e assim centenas de fotos chegaram impressas, em papel fotográfico, em tamanho de uma folha de sulfite, enormes em seu horror.
Sentados em absoluto silêncio fazendo aquela pesquisa e seleção macabra, de pouco em pouco tempo um de nós soluçava, com as emoções a flor da pele pelas imagens que víamos e que - felizmente - não foram mostradas para o grande público, apenas uma pequena parte foi publicada.
Na revista VEJA SP que chegou às bancas ontem há um texto de Ivan Ângelo falando das tragédias que acontecem em nossa cidade e que elas não surgem do nada. Ele menciona os conflitos entre gangues de 'neonazistas', punks, homofóbicos, os assaltos aos caixas eletrônicos, o consumo descarado de drogas pesadas que arrasta consigo a delinquência, os atropelamentos e a violência no trânsito entre tantas outras mazelas que assombram a maior cidade do país. E foi esse texto que me convenceu a publicar esta postagem.
Por mais triste, assombroso, horroroso que seja, não podemos perder a capacidade de nos indignarmos diante da ação de pessoas que não compreendem (ou não aceitam) que não podem atentar contra a vida de ninguém, por nenhum motivo. Que só crescemos na diversidade e não sob uma mesma e arcaica visão que separa os homens por religião, posses ou atributos físicos.
Não podemos deixar de exigir de nossos governantes que melhorem a qualidade da educação - base e fundamento de qualquer sociedade que se pretenda livre e justa -, que melhorem a qualidade da saúde pública, a oferta de empregos, a infraestrutura do país.
Só assim poderemos combater as desigualdades, os fanatismos que brotam da ignorância e do ócio, podemos cobrar as pessoas conjuntamente em seu papel como cidadãos e exigir dos outros aquilo que cobramos de nós mesmos.
Tudo isso, no entanto, começa com uma pequena lição: não faço o mal que não desejo para mim. Não jogo um papel na calçada de minha cidade e nem de nenhuma outra, não fico com troco que não seja meu, não busco lucro fácil que prejudique os demais, não tomo atitudes que impactem em desperdício de recursos, sejam eles naturais ou imateriais, não espero dos outros o carinho e a compreensão que eu mesmo não sou capaz de dar (senão a frustração vira ressentimento, o ressentimento vira raiva e a raiva vira irracionalidade).
Difícil, muito difícil.
Mas não impossível. A humanidade se pergunta (ao menos a parte dela que se sente 'parte' de um todo) o que fizemos de errado, para onde o mundo está indo. Assim como sempre foi, caminhamos para uma extinção, que é o final de cada momento da história, como foi e como será. Mas no meio do caminho podemos tomar algumas atitudes que facilitem essa jornada, que não provoquem tanta tristeza, nem tanto horror em nossos corações humanos, pois tudo isso impacta em nossa alma, essa sim permeando vários tempos na história, atravessando eras e aprendendo através delas, por vezes nutrida pelas alegrias, muitas vezes minada pelas tristezas.
Não podemos esquecer, pois o esquecimento nos levará a repetir os mesmos erros.
"Paz na terra, aos homens de boa vontade".
Buenas Sílvia,
ResponderExcluirnada se justifica com essas atitudes, mas fico pensando também em outro 11 de setembro o de 1973 no Chile....
saludos
Zzé